Mostrando postagens com marcador barros pinho. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador barros pinho. Mostrar todas as postagens

20.7.15

O ADRO DE SÃO BENEDITO, de Barros Pinho



oh como eu queria
guardar o vento
que circulava
no adro da igreja
de são benedito
em teresina
onde nele talvez
tenha escrito o poema
de amor mais puro do ofício
só o poeta tem essas coisas
de se esconder nas palavras



Barros Pinho
em Planisfério, 2ª edição
Teresina: Corisco, 2001


O RETRATO NAS PAREDES, de Barros Pinho



As casas como as pessoas
guardam cicatrizes
expostas no rosto do tempo.

Às casas sempre voltamos
nelas a vida anda por trás do que passou
existem na existência indo embora.

As casas onde morei para viver
na afoitosa e lúdica adolescência
abrem rugas na face branca das paredes.

De dentro delas saltam sonhos
que não querem envelhecer
e o menino açoitando o vento nas curvas do rio
que se arrasta na carne azul da paixão.



Barros Pinho
via Jornal de Poesia


SANTO ANTÔNIO NOME DE RUA, de Barros Pinho



a rua santo antônio
tinha mesmo
vocação poética
não é que lhe deram
o nome de olavo bilac

num alto perto
de uma faveira
morava o poeta
mário bento
meu professor
de decassílabo

mais abaixo
quem morava
era a madrinha dodó

na quitanda
rezando
e vendendo
cigarro selma

em frente
num casarão
uma lourinha
burguesa
tocava acordeon

no quarteirão
seguinte
meu pai me fez
proprietário
de uma garapeira
onde apenas ganhei
duas namoradas

rua santo antônio
do menino
metendo os pés
em tuas águas
do adolescente
que te fez revelações
rua santo antônio
de teresina
das mangueiras
das carambolas
e dos quintais



Barros Pinho
em Planisfério, 2ª edição
Teresina: Corisco, 2001


BALADA DE TERESINA – A CIDADE VERDE, de Barros Pinho



recordo
a adolescência
nas árvores
de minha cidade

no circo
das areias
que ainda
circula
em meu juízo

no cais
onde aprendi
a história
da pureza

no riscos
das gatas
espreitando
em cada esquina
da rua paissandu

na rua
pedro II
onde rodei
com a primeira
namorada

no vaga-lume
ferindo
o otimismo
no escuro
do cine-rex

nos bons
comícios da udn
naquele tempo
mulher de muito
respeito

nos bichos
oficiais
pássaros
camelôs
do mercado velho

nas íntimas
novenas
de são raimundo
na piçarra

na vulgaridade
eletrônica
da mensagem
de um alguém
para um certo alguém
que está ausente

nos meus gritos
ecoando
a céu aberto

olha a laranja
olha a bananeira

olha a saudade



Barros Pinho
em Planisfério, 2ª edição
Teresina: Corisco, 2001


BALADA DO RIO PARNAÍBA, de Barros Pinho



não conhecia
o mar
o rio de minha
cidade era meu oceano

no cais
na rampa
laranjas
prostitutas
a granel

o vento
entra
pelas narinas
com peixe
creolina
e cashmere bouquet

lá em cima
a máquina
pilando arroz

a banca
de gelado
tábuas
de pirulito

em baixo
barcas
barcaças
navegando

lavadeiras
abertas
ao sol

lanchas
vapores
fumegando

fiscal
de renda
paletó
e gravata
cuidando
das coisas
do estado

canoas
canoeiros
só passando

noites
vivendo
de aventuras

suicídio
na senda
do ciúme

do outro lado
timon
antiga flores

águas
tranquilas
correm
sob a ponte



Barros Pinho
em Planisfério, 2ª edição
Teresina: Corisco, 2001


10.4.14

AS VOLTAS DA PRAÇA PEDRO II, de Barros Pinho



praça pedro II
há quanto tempo não te vejo
só converso contigo
com os olhos na infância
em dúvida nos braços da adolescência
nos beijos rápidos da namorada fugidia
entre um e outro fícus benjamim
no tempo que se volta na busca
de outras voltas nunca
a derradeira no começo dos sonhos

praça pedro II guardo de ti
a leitura de muitos olhos atônitos
em tudo havia a inocência em flor
desejos dispersos no esperar
espera que nunca se confirma
até dizer que teresina vive
sempre dentro de mim



Barros Pinho
em Planisfério 2ªed.
Teresina: Corisco, 2001


9.4.14

Barros Pinho - síntese biográfica




José Maria de Barros Pinho (Teresina, 25 de maio de 1939 / 2012). Poeta, contista, político (Prefeito de Fortaleza/CE entre 1985 e 1986). Principais obras: Natal de barro lunar e quatro figuras no céu (1960), Planisfério (1969), Circo Encantado (1975), Natal do castelo azul (1984 ) e Carta do Pássaro (2004). A Viúva do Vestido Verde, publicado pela Record, foi cotado para o prêmio Jabuti de Literatura. Carta do Pássaro, reconstitui sua infância no engenho de seu avô, às margens do Rio Parnaíba, no Piauí. Membro da Academia Cearense de Letras.