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28.7.23

CARTOGRAFIA INFINDA, por Renata Flávia




Era dia de muito sol, como todos os dias
Quando Assis Brasil cruzava a Praça da Integração no Parque Piauí
M. Leite descrevia os urubus e o cheiro forte do mercado, quarteirões abaixo
Um ônibus marrom desce a Av. Maranhão
O centro brota no vão dos dedos de colegiais
Entre a beira e a coroa
Todos os dias é rio e cais
Arnaldo aparece de batom na capa do jornal anunciando a prainha que vem
Até hoje, a manhã recita Da Costa quando as barbas de um monge escorrem
[no Parnaíba antes das 7 horas
Todos os dias
O abandono cresce na fuligem do trânsito
Enquanto O.G. atende no Banco do Brasil da Álvaro Mendes, 1313
Chico faz o mesmo até às 4 da tarde
Quando desabotoa os dois primeiros botões da camisa rumo à Pedro II
Essa praça, onde H. Dobal caminha em círculos
Está entregue ao vazio
De frente, drogas, ratos e lixos circulam livremente onde antes havia poltronas de cinema
A 100 metros dali Paulo Machado enfrenta o poema da Teodoro Pacheco, 1193
No sentido contrário Genu reinventa fantasmas no último casarão da Antonino Freire
É dura a caminhada
Fontes Ibiapina passa na lateral da Central de Artesanato antes de descrever o incêndio
[e o salto metálico
Na Rua São João 1042 Torquato arruma as malas para partir, pois cansou
Não chore, Teresina é assim mesmo
Foi Faustino primeiro, depois tantos mais
Apesar de ser lindo o laranja neon desse sol que cai



Renata Flávia
Poema inédito em livro
Enviado pela autora


10.6.23

Tigre Lobo Cobra, de Mário Eugênio



Tigrelobocobra é o novo trabalho de Mário Eugênio, gaitista da extinta banda de blues BR-316. Foram meses trabalhando em cima das músicas e estudando processos de mixagem e masterização para fazer exatamente tudo que há nas 10 músicas desse álbum já disponível em todas as plataformas de música.

A força do disco não se prende apenas às guitarras pesadas e gingadas; existe uma atmosfera misteriosa, raivosa e, por vezes, sensual nas letras carregadas de referências literárias, lutas e assombros.

A gaita também exerce sua atração em algumas faixas, trazendo um pouco da versatilidade que o Mário já vinha mostrando no BR-316 ou em participações e gig’s com o André de Sousa, Clínica Tobias blues e outras bandas das antiga de Teresina e arredores.

“Por isso eu sou a tua espora, eu sou a cigarra que te agoura até às 6” e o som indignado de “Eu farei a tua hora e a tua vez” celebram a hora e a vez de tacar fogo nos racistas. Imagens delicadas como: “barco e pescador deslizam no oceano como um deus dormente” brilham no mar em “Barra Grande”.

A alegoria fantasmagórica de “Apenas uma sombra no meu quarto” rodeia diversas faixas, tanto na história contada na letra como na própria melodia e esses são frutos de uma paixão literária-musical pelo assombro, mistério e a solidão como também aparece em “Às vezes se esconder não é covardia”. Visões de Melville, Shepard, Hesse, Quincey+Baudelaire rodeiam as estrofes e, muito mais que referências diretas, é possível ouvir a atmosfera desses autores em notas, batuques, graves e um canto talhado e não pretencioso.

Tigrelobocobra traz desde o nome referências do caminho trilhado na composição da arte do Mário Eugênio, o delicado e irresistível perigo do Tyger no poema de Blake, a esperteza audaciosa e compartilhada do lobo e o arrastado serpetino da construção destes caminho, todos eles juntos.

Enfim, um disco diversas histórias, referências, entregas, paixões, com raiva e sensualidade.

Apresentação da Poeta Renata Flávia, publicada originalmente na Revista ACROBATA - literatura, artes visuais e outros desequilibrios, em  24 de fevereiro de 2023



Conheça o artista Tigre Lobo Cobra:



20.5.21

02 Poemas/Momentos no Café Art Bar







CAFÉ ART BAR


da tarde que segue nervosa
homens surgem suados
carregados de preocupações
destinos a esmo
me vê uma antártica gelada
lá fora praça pedro segundo
a claridade destrói o asco
ferrugem que incendeia o portão velho
na entrada de um estacionamento
a urbe urge roncos trôpegos
a tarde é consumida dentro de um café




Rodrigo M Leite, publicado na Cidade Frita, Teresina: 2013, Versão atualizada



(...)



ENTRE BANCOS SORRI CAFÉ ART BAR


entre bancos sorri café art bar
as vontades da vista da praça
cheia de saudade do que não vimos.
entre postes
entre hippies
sorri meu mais novo amor
rodeado dos antigos
de restos e velhas construções
armações que o tempo preserva feito bibelôs
feito coração velho já amargo e frágil
com portas grandes e coisas sem valor.
entre bancos, pedras, rochedos velhos
sorrir meu novo amor.




Renata Flávia, enviado pela autora

16.5.20

"fui tragada", Renata Flávia


fui tragada. me levaram em um dia cheio daquele sal que fica grudado na nossa pele em frente ao mar. nesse dia, nesse sal, fui tragada. um pedaço meu não quer voltar – nunca mais –, outro nem poderia. fiquei embaixo de escombros, um passado cheio de entulho e bagagens que nunca serão desfeitas. perdi os ossos. massa mole e crua digerida. quero a fórmula fácil. não suporto ameaça. quero o tato, o fogo de volta a esse corpo tragado. carnaval na esquina. teu corpo-poema se revirando em meu pensamento que rebola, bunda, costas, em tua cara de náufrago. meu corpo isca puxando de leve, de leve assim como o sal daquele dia pouco a pouco grudado e que já não sai. e já é pele sobre pele. calei quando explodi meu último artifício bélico. aos seus pés eu gritei músicas rápidas. três acordes, profanidades pelos pátios de guerra. meu sistema coronário parou de funcionar, baby. sou fogo. leoninamente fênix da cidade mais quente do mundo. nasci ali, entre o trago e a brasa. nasci ali na forma mais difícil de se segurar. faísca, caos, ar. uma mistura pronta pra


Renata Flávia, em Mar Grave, Editora Moinhos: 2018

10.4.20

"praça pedro segundo é a possibilidade do sonho", Renata Flávia


praça pedro segundo é a possibilidade do sonho, entre um teatro fechado e um centro pós-prisão, geme aflito meu coração nos braços de um amor esquisito desses que não se entende qual a mão. contrário. estribilho, música de pedras desfeitas na cabeça de meninos perdidos. a cidade geme alto meu puro sonho. meu amigo bebe despreocupadamente junto de meninos colegiais que se aventuram nos primeiros cigarritos mal bolados. alguém sorri alto às curvas da esquina da cidade sem memória. trago o peito cravado de amor mal resolvido nas lembranças desta praça. trago o peito marcado, pedro segundo, por todos teus bancos. o café me desafiando lágrimas a fio. algum hippie convence um real por anéis que não valem a flor que carregam. alguma madrugada deve guardar a surpresa que meu coração espera.


em Mar Grave, Teresina: Moinhos, 2018
Publicado também na Coletânea Tara, 2012

20.10.18

"marco zero ereto", Renata Flávia


marco zero ereto no caminho das pessoas que vão ao mercado. marco zero ereto inaugura o primeiro ato, entre tuas torres, entre tuas pernas, amparo! em plena praça da bandeira te atravessa, te fecunda ao meio. entorpecida em engano, ritual tântrico, cria a cidade mal nascida restaurada em sexo de pedra e devaneio. as flores que afogam as fontes do jardim, ontem foram tua beleza, amparo. ontem quando na última hora do dia marco zero em chamas derramou-se em casa e calor para povoar beira de rio, beira de sonho, beira de cama. é mentira que o amor tem encontro marcado. é mentira, amparo! que teus olhos virgens foram os primeiros a tocar este espaço. teresina treme. teresina em chamas. brilhantes purpurinas de sol no parnaíba. já existia, amparo. todas essas sinas. antes desse amor interessado já existia vida.


Renata Fláviaenviado pela autora (lustredecarne.zip.net)

16.8.14

PRÉDIOS INTEIROS SE ERGUEM NO CÉU DA TUA BOCA II ou segunda visão, Renata Flávia


uma cidade se cria
na poça de lama da avenida
a velocidade dos meus sonhos a atravessam
parte no meio o retrato da cidade diluída
pingos de amor deslizam na minha cara
milhões de pássaros povoam meu céu de boca
multidões dentro dos meus olhos fechados
te sou construída
te sou partida
te sou língua
lambi a cidade partida.


Renata Fláviaenviado pela autora (lustredecarne.zip.net)

PRÉDIOS INTEIROS DE ERGUE NO CÉU DA TUA BOCA I, Renata Flávia


cada verso deflagrado
escorre avenida, esgotos
todo personagem que escolho
respinga delírio, asfalto
monstros disfarçados
paradas de ônibus
bêbados ensaiando passos malabarizados.
poças de neon brilham no asfalto preto
cidade refletida respinga
na cara, língua desliza
lama, desejo
beijo a cidade, deliciada
atropelada pelas chuvas de janeiro.


Renata Flávia
enviado pela autora

PRAÇA DA COSTA E SILVA, Renata Flávia


de olho no Parnaíba,
o poeta se eterniza
numa sedutora
escuridão de orgias.


Renata Flávia
enviado pela autora

PRAÇA SARAIVA




praça dos loucos por deus ou sexo
dos infames, dos clérigos
praça saraiva decaída
mantém viva almas estudantis que burlam aula
almas amáveis que namoram em jaulas
guardada entre grades impostas
entre grades que insulta
te agride, te repulsa
praça saraiva dos loucos por deus
ou sexo



Renata Flávia
enviado pela autora

6.4.14

"o amor se instalou", Renata Flávia


o amor se instalou
embaixo da ponte metálica
fugiu de todas as cores holofotes e estradas
disse ser contra o mirante, o elevador e a escada
preferiu ficar no velho esquecido
do que ter o peito partido
em bamba estaiada.


Renata Flávia
enviado pela autora

ENTRE BANCOS SORRI CAFÉ ART BAR, Renata Flávia


entre bancos sorri café art bar
as vontades da vista da praça
cheia de saudade do que não vimos.
entre postes
entre hippies
sorri meu mais novo amor
rodeado dos antigos
de restos e velhas construções
armações que o tempo preserva feito bibelôs
feito coração velho já amargo e frágil
com portas grandes e coisas sem valor.
entre bancos, pedras, rochedos velhos
sorrir meu novo amor.


Renata Flávia
enviado pela autora

6.11.13

CANTEIRO DE OBRAS 2013, Renata Flávia


e a dança foi cancelada o som desativado. a polícia não bateu mais na porta e a graça foi posta a baixo. desmantelaram o coração do centro, de todos os nervos de lembrança só restaram escombros, pé de manga, estacionamento. desinstalaram a poesia e o canteiro foi esvaziado e aos poucos as marretas terminaram a porradas os trabalhos. duros golpes não demoraram a transformar em sucata o casarão antigo das nossas primeiras emboscadas – porrada! o coração do centro morto agoniza na sua última morada. porrada.

Renata Flávia
enviado pela autora

PRAÇA RIO BRANCO, Renata Flávia


deus me renegando compreensão
com uma igreja de costas
para minha tórrida visão
de cara lavada de suor
o sol imprensando meu estomago
como duas mãos
eu inerte entre as luzes
que só ascendem quando paro
meu coração largado
meu coração


Renata Flávia
enviado pela autora

Renata Flávia - síntese biográfica


Renata Flávia por Caio Bruno

Renata Flávia nasceu em mil novecentos e oitenta e nove em Teresina, Piauí. Formada em História, atualmente vive em uma biblioteca pública nos horários comerciais. Com poemas em revistas, jornais, antologias, sites e blogues, tem publicado o livros Mar Grave (2018, Moinhos) e Lustre de Carne (2019, Moinhos). email: renata.flavia07@hotmail.com