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11.6.21

Os Bares de Teresina, por Eugênio Rosa de Oliveira Ribeiro (2013)






Certa noite, pertinho do aniversário de 161 anos de Teresina, numa das cervejadas no Bar do Osvaldo, ficou uma pergunta no ar: O que ou quem mais representaria o jeito de ser da cidade de Teresina?

Conversando com o Conselheiro Fernando Porto, primeiro e único Comendador do Barrocão, veio a solução! Nossos bares e botecos são quem mais refletem a alma do Teresinense.

E por qual razão? Qual é a característica dos nossos botecos? O que os diferencia? Quais são eles?

A maioria de nossos bares é bem simples. Despojados, não muitos limpos (tem um com o nome “Bar do Imundo”), copo americano, cadeira de espaguete, ás vezes nem cadeira têm! E, apesar de serem um templo de celebração da mulher, são um ambiente eminentemente masculino.

O dono, geralmente mais grosso que lixa 40, contraria todas as lições do SEBRAE sobre a cortesia e atenção aos clientes.

No entanto, estes botecos são ponto de intelectuais, médicos, engenheiros, jornalistas, empresários, um sem número de pessoas conhecidas e bem sucedidas, além dos tradicionais cachaceiros dos diversos matizes.

Tem boteco frequentado pelas mesmas pessoas faz 40, 50 anos. Agora já são os filhos que estão tomando o lugar dos pais.

O Bar do Osvaldo, por exemplo, que funcionava perto da casa do estudante, antes de mudar para o Barrocão (ficou no lugar do bar do seu Luís Veloso, pai da primeira dama Lilian), foi frequentado por sucessivas gerações de estudantes (iam comprar ovo e sardinha!).

Muitos desses estudantes se formaram e, apesar de profissionais de sucesso, mantiveram o hábito de visitar o veterano da guerra (seu Osvaldo lutou no Suez).

No Osvaldo não há cadeiras, nem mesas. Quando aparece uma pessoa conhecida (só se for conhecida) ele tira detrás do balcão um tamborete e, assim, os fregueses se posicionam uns de frente para os outros nos dois lados do balcão.

O balcão de madeira do seu Osvaldo tem mais de cem anos e pertenceu ao comércio do senhor Adelino, depois fiscal de rendas do estado, pai do Agenor (engenheiro), Juscelino e Dilson Pinheiro (médicos já falecidos) que permaneceram, como o pai, assíduos frequentadores.

Local de encontro de muitos amigos como: Tancredo Serra e Silva, Edmar Mota e Bona, Peninha, Manoel Afonso, José Jucá Marinho, Bernardo Castelo Branco, Oscar Castelo Branco, Ivadilson, Raimundo Marvignier, Os irmãos Raldir, Bizarria e Roosevelt Bastos, José de Sousa Santos, Afonso Ferro Gomes Filho, João Agrícola dos Passos, Walter Moura, Alberoni Lemos Neto, Ismar Andrade, e muitos outros.

Dá tristeza saber que uma grande parte já se foi!

Outros bares formam uma verdadeira confraria. Um grande exemplo é o Santana. Reduto de famílias tradicionais, os clientes se sentem irmanados e muito amigos. É muito frequentado por empresários e profissionais liberais. Os membros promovem diversos eventos durante o ano: Carro dos Amigos do Santana no Corso, filme do ano, enduros e por aí vai... Tem cliente que começou criança tomando refrigerante no antigo endereço em frente à Igreja São Benedito.

Mas afinal, quais são os bares tradicionais de Teresina do passado e do presente? Eis alguns exemplos:

Maria Tijubina: ficava no Mafuá entre o muro do Cemitério São José e a linha do trem era frequentada por boêmios e notívagos muito conhecidos como José Lopes dos Santos e o mestre do cavaquinho da Rádio Difusora Caco Velho.

• Bar do 71: na Praça do Fripisa, o dono “o Neguin Baixo” só usava branco, roupa e chapéu. Era o ponto dos estudantes da Faculdade de Direito, que funcionava na praça, quando terminavam as aulas.

• Bar do Zé Garapa: na Piçarra onde funciona hoje a Jacaúna, ponto de encontro dos melhores jogadores de sinuca. O melhor jogador era o Raimundinho da Bindá. Seu irmão Antônio da Bindá era conhecido como o maior boêmio do Piauí e um grande cantor.

• Restaurante da Dona Maria Maior: localizado na Rua Paissandu, reduto boêmio. Quando terminavam os filmes, as tertúlias e o movimento da Praça Pedro II, os homens desciam. O nome oficial era Fála-se Hotel, possivelmente uma corruptela de Pálace Hotel.

Bar Carvalho: Muito famoso, frequentado pela elite, era da família do prefeito Firmino Filho e do vereador Inácio Carvalho, ficava na Praça Rio Branco e era considerado a melhor comida de Teresina.

• Bar do Cabecinha: No Cajueiro, antes funcionou na Santa Luzia com David Caldas, reduto do famoso Basilão dos Cajueiros.

Bar Carnaúba: dos irmãos argentinos Carlos e Osvaldo Fassi, ao lado do Theatro 4 de Setembro, totalmente feito de carnaúba. Em suas proximidades funcionava a Rádio Calçada, em frente a Lanchonete Americana, onde as decisões políticas do Piauí eram tomadas. Entre os seus frequentadores temos: Deputado Ciro Nogueira (pai), Dr. João Mendes Nepomuceno Neto, Prof. Magalhães (pai de secretario de segurança) dentre outros.

• Bar do porão do Clube dos Diários: onde existia um cassino

• Largo do Boticário, no Clube dos Diários: no corredor a esquerda de quem entra no Clube, reduto de escritores e intelectuais, até os garçons eram famosos: Raimundão (pai da delegada Vilma), Careca e Cirilo.

• Bar e Hotel Avenida: onde hoje é o Hotel Piauí (Luxor), frequentado pelos sírios e libaneses, nossos conhecidos carcamanos.

• Cantinho do Tufy: também de árabe, o dono era o Jesus Thomaz Tufy, exercia suas atividades na Rua Álvaro Mendes esquina com a Rua Simplício Mendes, foi a primeira lanchonete a vender esfirra e quibe na cidade.

• Bar e Restaurante do Auto Esporte Clube: Na Rua da Palmeirinha (Clodoaldo Freitas), lugar de quem queria comer uma boa panelada. Primeiro restaurante “delivery” de Teresina.

• Chicona do Poti Velho: figura folclórica fazia piaba frita e peixe de primeira (era quem fritava os peixes – bem poucos por sinal– de minhas pescarias no encontro das águas).

• Galinha da Júlia: única comida que se pode dizer que é genuinamente teresinense, funcionava perto do Hospital São Marcos. A galinha era feita em panela de ferro e lenha, recheada com mexidos e bastante condimentada. A receita morreu com ela, mas fez tanto sucesso que a tripulação da empresa aérea Real Aerovias, ao fazer escala em Teresina já vinha com a incumbência de levar a galinha para o Rio de Janeiro e outras cidades.

• Bar do Zé de Melo: em pleno funcionamento na Dom Severino, tão frequentado e querido que existe uma confraria organizada dos amigos do seu Zé.

VTS: Na Rua João Cabral, vende um peixe muito famoso e possuía uma seleta freguesia, exemplo: Totó Barbosa, Elisiário, Carlos Said e Nodgi Nogueira

E quantos outros! Miúda, Bar do Edverton, Gela Guela (a cerveja mais gelada da cidade), Rifona, Zé guela, Sapucainha, Coqueiro Verde, Bar do Gelatti, Pesqueirinho, Bar do Lula, Bar do João Veloso, Bar do Amauri (reduto de jornalistas), Bar da Tia Maria (no encontro das águas), do Ulisses, Zé Filho, Pé Inchado, Ribamar, do Pernambuco, Bar e Restaurante Acadêmico (do Pedro Quirino).

Em Teresina, o bar é tão importante que até candidatura de governador já foi decidida em um.

Até hoje, não há maior diversão para um teresinense da gema que encontrar os amigos no final da tarde e fins de semana, no seu boteco favorito, para trocar informações e esmaecer as tensões de um dia de trabalho.

Nem melhor local para se fazer amizades que duram toda a vida.

São os bares e botecos que fizeram a alegria dos teresinenses de ontem e de hoje.

E que refletem muito do nosso jeito simples e amigo de ser.



Eugênio Rosa de Oliveira Ribeiro
Em 10/08/2013 | Teresina/PI

Publicado no blogue do Poeta Elmar Carvalho "Recebi o vertente texto por WhatsApp. Não tendo o contato do autor, não lhe pude pedir autorização para a publicação em meu blog. Espero que ele não se aborreça. Quem me enviou o texto também não tinha o endereço virtual dele. Publiquei porque achei um texto muito bom e importante para a memória de Teresina."


9.4.16

TERESINA, ANOS 70, William Melo Soares


Quintais de plantas e pássaros
menino chupando o dedo
ou picolé Amazonas
Arnaldo histórias em quadrinhos
humor sangrento no traço
da rua do Barrocão

Davi Aguiar os passos
dos malucos da cidade:
sexo, drogas e rock'n roll.

Domingo dia de clássico
rivengo no Lindolfinho
Carlos Said comentando
para o bom entendedor
pastel da Maria Divina
quem comeu nunca morreu

Seu Cornélio pão de queijo
arretado de sabor
a turma da palmeirinha
baixa da égua Sambão
coroas do Parnaíba
piau frito e pedaleiros
Dom Avelar Oração
Por um Dia feliz.


William Melo Soares
em Nadança dos Peixes - Antologia Provisória
Teresina: Bienal, 2015

20.1.16

RUA DA PALMEIRINHA, Herculano Moraes


A rua da palmeirinha
perdeu seu nome de origem,
como as outras ruas.

A palmeirinha era símbolo
da rua dos meus meninos.
Dos meninos que se perdiam
pela baixa-do-chicão.

A baixa-da-égua já mudou de nome,
mudou de nome o bairro do barrocão.

O asfalto sepultou os trilhos da rua Bela,
o tempo mudou o nome da rua Estrela.
E num recanto perdido da memória
a lembrança viva da rua Glória.

Um dia mudarão todos os nomes,
e a cidade ficará perdida
procurando suas ruas mortas.


Herculano Moraes
em SECA, ENCHENTE, SOLIDÃO
Editora EMMA: Porto Alegre, 1977

25.11.15

SOBRE IDENTIDADE, CARNAVAL, PERDAS E CINZAS, por Ací Campelo



Agora que já foi decretado o fim dos desfiles das Escolas de Samba de Teresina - e que meus ouvidos cansaram de perguntas se sou a favor ou contra - posso escrever e recordar algumas lembranças e lançar algumas questões.

Sou um apaixonado pelo carnaval, combina com meu jeito tímido e extrovertido, afinal de contas é no carnaval que podemos fazer tudo aquilo que queremos, pois é naquele espaço de dias da embriaguez, da música e da alegria que todos somos iguais, ou quase. Há mais de 40 anos moro no Bairro Mafuá, pertinho da Vila Operária um dos berços do samba piauiense. Convivi desde os anos 70 com escolas e blocos carnavalescos, pó de maizena e lança-perfume. Teresina era uma festa no carnaval: River Atlético Clube, Cabos e Soldados, Jockey Clube, União Artística Piauiense, Clube Pirantinga, Classes Produtoras, Flamengo, Marques, Baixa da Égua, Palmeirinha, Frei Serafim e os desfiles das Escolas de Samba, imperdível, meu velho! Triste foi quando parou tudo nos anos 80. Teresina parecia ter escurecido sem as festas de momo, uma escuridão que desnorteou os tamborins e calou as cuícas; um amargor na goela dos puxadores de samba-enredo e uma tristeza sem fim nos corações dos compositores e dos foliões.

Veio os anos 90. As fantasias guardadas e o peito dos apaixonados pelo carnaval batendo cada vez mais forte, desistir nunca! Esperança e ritmo na cadência do samba. As forças se aglutinaram e, em 1993, aconteceu um evento denominado Reviver Carnaval, um Seminário realizado pela Fundação Cultura Monsenhor Chaves e a Secretaria de Esportes e Lazer - Semel, na Casa da Cultura de Teresina, tudo acompanhado por uma exposição de fotos, fantasias carnavalescas. Foi a partir dali os tamborins começaram a esquentar. Participei de uma mesa onde estava Marcos Peixoto, o super-produtor cultural que fazia a Micarina com grandes trios baianos, nada que impedisse nosso carnaval de existir. O seminário foi todo documentado, e ali estavam todos os presidentes de escolas de samba e pessoas apaixonadas pelo carnaval deixando suas idéias e opiniões. O carnaval tinha voltado para a alegria de todos, principalmente minha. Tenho o documento, quem quiser ler me peça uma cópia.

1994, todas as Escolas de Samba na Avenida Frei Serafim. Mauro Monteiro, um gigante, dando tudo de si como organizador. O povo de Teresina invadiu a Frei Serafim, que ficou pequena, veio Marechal Castelo Branco, brilhante ideia, mais espaço e conforto. Em 1997, um ingrediente a mais: o corso carnavalesco e o caminhão das raparigas-atrizes piauienses representando, criação da FCMC, sob a responsabilidade de Cecilia Mendes, Afonso Lima, Laria Sales, Ací Campelo, Daniel, Wellington, uma festa! No começo, dois caminhões apenas, dez anos depois o corso tomaria conta da cidade. Mas, e agora? Como ser feliz no carnaval se não vai mais existir desfiles? Como ficará o corso? Aliás, corso pra que?

O mais terrível de tudo é negar a tradição. Escolas de Samba sempre existiram em Teresina, há mais 50 anos, não é, então, uma tradição? Não é uma história? Por isso é que às vezes penso que nós somos culpados pela nossa incrível capacidade de negar a nós mesmo. Estamos sempre acabando com aquilo que construímos, com aquilo que pode sugerir nossa identidade cultural, nossas raízes, nossas heranças, então, ficamos navegando e boiando sem paradeiro, na busca de qualquer tábua de salvação, num desrespeito total à construção de nossa cidadania. No Piauí, o gosto pessoal de alguns quando se apoderam do poder paira sobre o gosto dos outros. Não gosto, não quero, não tem pra ninguém. Mesquinhez pura.

Fico comigo a lembrar do bloco do Pererê, alô Ral! Do bloco da Tijubina do Mafuá, criado por Ubirani Rocha, do qual banquei o letrista dos sambas e, por último, do Baião de Boi, do Severinos Santos, onde desfilei nos últimos três anos. E o Bosco com sua Escola de Samba da qual me homenageou, me colocando no Samba Enredo? E o príncipe do carnaval, senhor da glória Manuel Messias. Onde vamos dançar agora? E pra quem? Não irei aos bairros vê escolas de samba desgarradas fazendo coro para trios elétricos, nada contra, absolutamente. Acho que até os próprios bairros irão estranhar, afinal de contas muitos deles se dirigiam a avenida para vê as escolas, não é verdade?

Mas, vamos com calma. A identidade de um povo é construída pedra sobre pedra e, às vezes, ficam só as pedras, para renascer das cinzas matando a tirania. Que viva o carnaval!



Ací Campelo,
em 27 de julho de 2009
via blogue do autor