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28.1.16

IMPRESSÕES DE VIAGEM, Edmar Oliveira


Uma amiga perguntou pelo Piauinauta, que não sai há quase um mês, e eu falei que estava enrolado com o lançamento do meu TERRA DO FOGO em Teresina e que tinha de ficar lá por uns dez dias. Ela então falou: “sei, você está de licença paternidade”. Acertou assim.

Cheguei para o “Sarau dos Amigos do Cineas” na Oficina da Palavra, onde o livro foi muito bem recebido. Passei toda a semana indo ao stand do Leonardo, que tem editado livros de escritores da terra (muito bem caprichados), autografando o TERRA DO FOGO, que por sinal esgotou o estoque de lançamento. Eu e Salgado Maranhão fizemos um bate-papo literário discutindo o meu livro e o dele (MAPA DA TRIBO) para uma plateia de cinquenta a sessenta pessoas às oito horas da manhã, o que me surpreendeu. Geraldo Borges estava lançando ESTAÇÃO TERESINA anunciado aqui no Piauinauta anterior.

Boas conversas com Paulo Tabatinga, Gisleno Feitosa, Rodrigo M Leite, Durvalino Couto, Feliciano Bezerra, Wellington Soares, Cineas Santos, Graça Vilhena, Paulo Vilhena, João Carvalho, Fonseca Neto, Alexandre Carvalho, Gilson Caland, Climério Ferreira e  Helô, Keula Araújo, Luana Miranda, Poeta Willian, a muito jovem e bonita escritora Fran Lima, Deusdeth Nunes e a turma do Conciliábulo, entre tantos outros que tive por bem encontrar. Fui entrevistado por várias emissoras de rádios que cobriam o evento, entre elas a de Marcos de Oliveira e a de Leide Sousa. E ainda deu tempo gravar um depoimento sobre o cinema marginal dos anos 70 para Patrícia Kelly e Morgana, que fazem um documentário como monografia do curso de história e jornalismo. As meninas são brilhantes. E eu estou tão velho que virei pesquisa. Mas é bom ser reconhecido.

Tinha tudo pra ficar contente. Mas não fiquei.

Me hospedei no Hotel Central, em frente ao Clube dos Diários, ao lado da Praça Pedro II e seu Teatro 4 de Setembro, complexo que foi outrora o centro pulsante e cultural da cidade. Após cinco dias fui para a casa do meu irmão Maioba angustiado pela solidão. A cidade entre os dois rios, que se estendia do encontro de suas águas no Poty Velho até a Vermelha (citada no filme genial do Torquato Neto) não existe mais. Foi definitivamente abandonada por seus habitantes que atravessaram o Rio Poty e ergueram uma cidade moderna na zona Leste. Mas que não tem nenhuma lembrança da minha cidade.

A minha cidade é uma cidade fantasma. Os poucos e pobres habitantes que ali ficaram não saem de noite nas suas ruas escuras com medo de assalto. Trancam-se em suas casas. Os de mais posses fazem cercas elétricas para protegerem a sua solidão. As ruas foram entregues ao drogados, aos desocupados que ocupam uma cidade sem lei e sem ordem. Em suas ruas desertas, mesmo ao meio dia, encontrei duas pessoas usando drogas. Não senti qualquer medo. Eram pessoas que eu conhecia da minha infância naquelas, outrora, ruas agitadas. Agora estavam os dois usando drogas numa cidade trancada com medo deles. Esquisito. Conversamos sem medo entre nós. Eu não me senti ameaçado por eles. Fiquei com pena de a cidade os terem tragado pela fumaça de um inexistente futuro.

Sem querer contrariar os meus anfitriões do Salão do Livro do Piauí (SALIPI), até entendo os seus motivos de o terem tirado da Praça Pedro II para que acontecesse este ano na Universidade Federal, que também fica na Zona Leste da nova cidade. Mas não concordo.

Desculpem, mas penso que a cultura abandonou também a cidade antiga. Não digo que ficou elitista porque a Universidade pública congrega estudantes de todas as classes. Mais ainda com o sistema de cotas. Mas acho que a cultura abandonou também a cidade antiga. É preciso que analisemos este fato mais devagar. Não vou fazer agora.

No livro que em Teresina fui lançar conto uma história triste que a cidade tinha esquecido. Os incêndios dos anos 1940. Acho que em breve um cronista vai contar essa história, também muito triste, do abandono da cidade antiga. A impressão que eu tive, e que me encheu de tristeza, é que ela não mais existe. E uma cidade sem passado é uma cidade sem futuro. 


em 15 de junho de 2014
em Piauinauta

17.8.14

FANTASMAS DO VELHO BALNEÁRIO DOS DIÁRIOS




Fantasmas, fantasias oníricas de viciados em drogas, inumeráveis pichações e imundície velam o antigo casarão de dois pavimentos, abandonado na Praça Ocílio Lago, onde funcionava o Balneário do Clube dos Diários, no Jóquei. Só os despojados, como o idealista, advogado, escritor e jornalista, Kenard Kruel, topariam a proeza de resgatar o prestígio do vetusto patrimônio, transformando-o em centro de manifestações artísticas.  E o show já começou. Exige apoio de autoridades e amantes das artes. Kenard iniciou a limpeza, atende compromissos no local, organiza arquivos da Fundação Nacional de Humor. O médico José Aírton juntou quatrocentos amigos, festejou seu aniversário ali, conseguindo 12 mil reais para a instituição. Construtoras prometem reformas.

A Fundação Nacional de Humor projeta, para breve, show e escola de humor na praça, museu de arte contemporânea, além de festivais de cartuns, caricaturas, quadrinhos.

A geração atual pouco ou nada sabe sobre aquele bucólico prédio e sua praça, urbanizada há algum tempo. A tarefa inicial de Kenard Kruel já espantou boa parte das miragens e lucubrações.

Entre as décadas de 1950 e começo de 60, o Bairro do Jóquei praticamente não existia. Imensa floresta cobria quase toda a Zona Leste de Teresina. Só a velha ponte de madeira, onde, hoje, se ergue a Ponte Wall Ferraz, servia de passagem sobre o Poti. Construiu-se outra ponte, a Juscelino Kubistchek, de concreto, na segunda metade dos anos 50, ligando a Avenida Frei Serafim à Zona Leste. Coronel Miranda, proprietário do jornal O Dia, juntou grupo de notáveis amigos, fundaram o chique Jóquei Clube, com manhãs dominicais lotadas de banhistas, além das corridas de cavalos e tertúlias semanais. Endinheirados adquiriam lotes enormes e arborizados, construíam modernas residências, desfrutavam a noturna temperatura serrana.

O Jóquei Clube atraiu expressivos associados do Clube dos Diários. Em resposta, líderes diaristas, comandados por Moisés Cadah, doutor João França, Edgar Nogueira, general Gaioso, Durvalino Couto, João Carneiro e Camilo Santos Hidd, fundaram o Balneário Clube dos Diários, que se estendia da atual Praça Ocílio Lago à Avenida N. S. de Fátima, onde se ergue um supermercado. Duas piscinas e bar ocupavam o segundo pavimento do prédio. Aos domingos, música ao vivo. Filhos de sócios iam do centro da cidade, de ônibus, lotavam o balneário a partir das 9 da manhã de domingo, até 2 da tarde. Certa manhãzinha, ainda escura, Hermínio Conde, neto de Antonino Freire, governador no início do século XX, dirigiu-se ao Balneário ainda deserto. Num salto do trampolim, faleceu.  Meu cunhado Marcos Hidd, filho de Camilo Santos, parece delirar, recordando um tempo, quando Teresina começava a se esbaldar nos recentes balneários, Jóquei, Diários, logo mais o Iate Clube. Ainda se curtiam deliciosas manhãs, nas praias alvíssimas e límpidas águas do Poti e Parnaíba.   

A Fundação Nacional de Humor tenta resgatar alguns sonhos que se perderam com o crescimento e modernização de Teresina. Se não cuidar, fantasmas e fantasias oníricas cuidarão do lixo.



José Maria Vasconcelos
via blogue do poeta Elmar Carvalho
em 16/08/14

21.10.13

SR. CORNÉLIO



Cornélio Evangelista da Costa, o Sr. Cornélio, que completa 90 anos no próximo dia 28 de agosto, disse que não tem saudades de tempos atrás. "Gosto da Zona Leste de Teresina pelos seus arranha-céus", afirma. Há quarenta anos, ele se instaurou no ponto mais badalado do centro da cidade, a esquina da Praça Pedro II com a Avenida Antonino Freire, a menor avenida do mundo, construída para homenagear o governador do estado entre 1910 e 1912. O cardápio ainda é o mesmo: pão de queijo e refrigerante. Ele mesmo cuida da lanchonete até hoje. É um observador do seu tempo e diz que até os costumes mudaram. "Uma coisa interessante, os homens circulavam o coreto da Praça Pedro II pela direita e as mulheres, pela esquerda, era assim que se paqueravam. Se você fosse deixar a moça na casa dela, era casamento feito", revela. Ex-vizinho de figuras ilustres como os governadores Helvídio Nunes e Leônidas Melo, ele relembra que a atual area nobre da cidade, a zona leste, era um local de veraneio, onde os comerciantes do centro mantinham sítios para passar o final de semana. "As pessoas mais ricas da cidade moravam na Avenida Antonino Freire e na Avenida Frei Serafim", lembra. Natural de São João dos Patos "MA", Sr. Cornélio ficou viúvo às vesperas de completar bodas de ouro. "Foi amor a primeira vista. Tenho três filhos, cinco netos e dois bisnetos", disse. Sr. Cornélio não tem planos de parar. Todos os dias, o forno da lanchonete Mary Lucy assa mais de cem pães de queijo que são consumidos ainda quentes.



Revista Veja 
Edição 2229 
Ano 44 - nº 32, em 10 de agosto de 2011